"Utøya 22 de Julho: Terrorismo na Noruega" é tensão ininterrupta
Em 22 de Julho de 2011, a Noruega viveu um dos episódios mais trágicos de sua história, quando dois atentados terroristas estarreceram sua população. O primeiro aconteceu na capital, Oslo, com uma bomba sendo detonada no prédio da sede do governo. O outro representou um verdadeiro massacre na pequena ilha de Utøya, resultando em 77 mortos, 99 feridos gravemente e uma geração inteira traumatizada para sempre. Esse ataque, por sinal, é o foco deste filme, o representante norueguês na corrida por uma vaga entre os cinco finalistas ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro.
Logo depois de exibir filmagens reais do ataque à Oslo, a produção corta (pela última vez) para o cenário principal da história, uma pequena ilha que está recebendo uma colônia de férias, repleta de jovens ávidos por diversão, descontração e alguns momentos longe de adultos. É nesse cenário que surge um maníaco identificado como ‘um supremacista de extrema-direita’, disparando contra qualquer um que ousar correr. Nesse caos absoluto acompanhamos a jovem Kaja (Andrea Berntzer) que se divide entre as tarefas de escapar da mira do atirador e procurar sua irmã mais nova.
Beneficiando-se de uma estrutura que afaga o coração do espectador com um clima amistoso que domina os primeiros minutos de projeção e logo nos atira no caos absoluto, o roteiro é bem sucedido ao estabelecer desde já cada personagem e sua importância para a história, mesmo que o ritmo frenético e a tensão crescente só nos estimule a torcer para que tudo acabe logo.
Essa atmosfera tensa é construída não só através da câmera única que segue Kaja e os demais personagens, mas principalmente por transformar-se numa espécie de câmera-personagem, já que corre junto com os jovens, cai, se esconde e até espia entre as árvores. Esse artifício, além de provocar adrenalina e manter o ritmo acelerado, é fundamental para nos inserir na história, numa experiência imersiva como poucos longas foram capazes de oferecer. Assim, sentimos o mesmo horror vivenciado por Kaja e seus compatriotas.
Utilizando o design de som de forma inteligente, podemos até não saber e muito menos ver o psicopata, mas sentimos sua presença através dos tiros, já que o volume dos ruídos acompanha a distância a que foram disparados. Sendo assim, por mais assustador que possa parecer a cadência aleatória de tiros, não há pavor maior do que escutá-los como se estivessem ao seu lado, e essa sensação é palpável.
Infelizmente, o filme comete alguns equívocos no caminho, como ao levar sua protagonista a cantar (isso mesmo) num momento onde claramente não há clima para isso. Aliás, o roteiro não demonstra a menor competência para ilustrar as conversas durante a narrativa, apelando para alívios cômicos artificiais (numa situação como essa, há motivo para rir?) e diálogos que em nada agregam ao filme (geralmente aqueles envolvendo Magnus). Felizmente, há algumas sutilezas que aumentam a carga dramática, como o subtexto envolvendo um jovem muçulmano com medo de ser afetado caso o atirador também seja um, e um momento de partir o coração envolvendo uma mãe ligando para alguém já abatido pelo atirador.
Tão impactante quanto seu próprio relato é a reflexão de que nem todos os atentados são de autoria da Al Qaeda, pois às vezes o problema pode vir de quem menos se espera: de dentro do próprio país. Pode ser aquele vizinho estranho ou o conhecido com ideias radicais. Afinal, há perigo maior do que aquele representado por quem convive conosco?
NOTA 8,5
Crítica originalmente publicada como parte da cobertura do Festival do Rio 2018