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"Tempo de Guerra" impressiona pela autenticidade

  • Foto do escritor: Guilherme Cândido
    Guilherme Cândido
  • há 11 minutos
  • 3 min de leitura


O cineasta britânico Alex Garland se une ao veterano de Guerra do Iraque Ray Mendoza, hoje consultor prestigiado na Indústria, não para criar um filme de guerra hollywoodiano tradicional, mas para experimentar, num projeto quase documental do qual o realismo é a grande estrela. Garland já havia bebido da fonte do Cinema Visceral em Guerra Civil, seu ótimo filme anterior. O terceiro ato daquela produção trazia sequências de ação ultrarrealistas, dispensando o uso de trilha sonora e proporcionando espaço para o design de som brilhar. Aqui, ele dobra a aposta e acaba construindo um retrato brutalmente verossímil da Guerra. Sim, com G maiúsculo.

 

Independentemente de ideologia, o realizador dá material suficiente para o espectador demonizar os conflitos armados ou idolatrar seus heróis (aqueles que conseguem sobreviver). Que, por sua vez, passam longe de baluartes da virilidade: são jovens de carne e osso, que sentem na pele os horrores da guerra. Justamente por serem humanos e não super-heróis, eles sentem medo, dor, insegurança e raiva. Garland e Mendoza criam situações tão intensas que sobra pouco tempo para rompantes de bravura.

Baseado nas experiências do próprio Mendoza, aqui interpretado pelo canadense D'Pharaoh Woon-A-Tai (indicado ao Emmy pela comédia Reservation Dogs), o filme acompanha uma equipe de SEALs em missão numa cidade iraquiana. A projeção tem início com um momento de descontração de uma companhia inteiramente formada por homens na faixa dos vinte anos. Trata-se de uma gentileza concedida pelo roteiro, uma espécie de respiro antes de mergulhar o espectador numa situação irremediavelmente tensa.

E o compromisso com a autenticidade é tamanho, que Warfare (no original), ao contrário de seus colegas de gênero, não hesita em mostrar a feiura da guerra em toda a sua crueza. Membros amputados, gritos de sofrimento, rastros de sangue. Não espere que a câmera de Garland e Mendoza desvie o foco durante os momentos de maior choque e prepare-se para encarar imagens impactantes, sem floreios.

Aliás, os realizadores confiam tanto na força do registro, que esnobam a utilização de acompanhamento sonoro. Eles não precisam de acordes ensurdecedores quando querem provocar sustos, uma explosão inesperada faz o trabalho por si só. Melodia sinistra para criar suspense? Não, basta ficar tempo suficiente ao lado dos militares quando estes exploram uma aparentemente pacata vizinhança à procura de um local para servir de base. Nesse aspecto, o design de som mostra-se fundamental e repare como é possível ouvir veículos e tropas se aproximando há centenas de metros de distância. Ou a diferença nos disparos entre armas dos mais diversos calibres. 

A verossimilhança passa pela burocracia, que emperra situações extremas, como a solicitação de apoio aéreo ou um resgate médico. Também não é todo filme que reserva tempo para mostrar os soldados fazendo anotações, montando e desmontando equipamentos ou realizando pausas para esticarem a coluna. Detalhes que, ao não passarem despercebidos, conferem ainda mais credibilidade ao experimento cinematográfico, mais próximo de um documentário do que de uma dramatização com pinta de videogame.

Essa abordagem, no entanto, gera efeitos colaterais jamais contornados pela dupla de realizadores. Ao priorizar o envolvimento pelas circunstâncias do combate, perde-se o elo com os personagens. Tente identificá-los pelo nome e perceberá que mal conhecemos aqueles com os quais deveríamos nos importar. Sabemos, sim, que Will Poulter (o Adam Warlock de Guardiões da Galáxia Vol. 3) vive o líder do grupo, que Cosmo Jarvis (da premiada série Xógum - A Gloriosa Saga do Japão) interpreta um franco atirador, assim como Taylor John Smith (do fraco Um Lugar Bem Longe Daqui). Mas quando Joseph Quinn (De Gladiador II) é atingido ou um determinado personagem fica em estado catatônico, tudo o que sentimos é pena. Pela situação e não por gostarmos de Fulano ou Beltrano. Até porque, na guerra, os soldados são igualados pela missão que cumprem. Quem morre vira estatística, números que são passados pelo rádio na esperança de justificarem uma extração, que tampouco será uma certeza de salvação (até tanques podem ser atacados, lembremos).

O que fica após pouco mais de oitenta minutos de projeção (passados num piscar de olhos) é a certeza de ter testemunhado um experimento bem-sucedido em termos técnicos e de autenticidade, mas ainda sim incompleto.



NOTA 7,5

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