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Humor popular de "Vizinhos" é prato cheio para Hassum e Manfrini

Foto do escritor: Guilherme CândidoGuilherme Cândido

A premissa não é nada original, aliás, nem o título é. “Vizinhos” já foi filme com John Belushi e Dan Aykroyd nos anos 80 e também com Seth Rogen e Zac Efron nos idos de 2014. Aqui, na versão tupiniquim, cabem a Leandro Hassum e Maurício Manfrini (o Paulinho Gogó) os papéis homônimos: Walter (Hassum), após desmaiar em seu trabalho como vendedor de uma loja de equipamentos musicais, descobre que está à beira de um colapso nervoso. Seguindo recomendação médica, ele se muda com a esposa (Júlia Rabello) para um lugar afastado da metrópole, na esperança de encontrar algum sossego, mas logo descobre que seu vizinho (Manfrini) é avesso à tranquilidade.


Escrito por Paulo Cursino, roteirista cujo estilo popularesco casou perfeitamente com o humor rasgado de Hassum em obras como Até Que a Sorte nos Separe e O Candidato Honesto, replica a dinâmica dos filmes supracitados trazendo o contexto para a realidade carioca. Saem os universitários baladeiros, entra o suburbano raiz, afeito a churrascos regados a muito samba.

Samba, aliás, é uma das paixões de Toninho, vivido por Maurício Manfrini (Os Farofeiros) como uma homenagem escancarada a Zeca Pagodinho, seja pelos óculos estilizados, o corte de cabelo ou a postura curvada. Já Leandro Hassum (Tudo Bem no Natal Que Vem) tenta interpretar Walter dentro do estereótipo do sujeito certinho, com direito a penteado conservador, bigode e óculos. O problema é que Hassum, vindo dos espetáculos teatrais, tem imensa dificuldade para se manter fiel ao problemático Walter. Afinal, o histrionismo do ex-Rede Globo joga contra a postura supostamente pacata de seu personagem, cuja manifesta aversão a sons altos é eclipsada pela performance escandalosa de Hassum.

Não que isso seja um grande problema, pois o diretor Roberto Santucci, que fez carreira comandando chanchadas globais como aquelas protagonizadas por Hassum, guia a narrativa por caminhos farsescos, no melhor estilo Paulo Gustavo, embora sem a verve anárquica do saudoso comediante. O que vale aqui é o humor como um fim em si mesmo, confirmado pela estrutura frouxa, remetendo a uma colagem de esquetes que só não fica engessada graças ao carisma e ao talento de seu elenco.

A Santucci, cabe um elogio merecido graças à sua evolução como cineasta. Sob o comando da Globo Filmes, ele ficava preso a uma linguagem televisiva que transformava seus filmes em subprodutos, com todos os cacoetes das mais datadas atrações da emissora carioca. Hoje, finalmente liberto dessas amarras, o diretor encontra sua voz num estilo moderno em termos técnicos, dialogando diretamente com as novas gerações, embora siga apegado demais a velhas piadas.

Pois se as gags envolvendo os ensaios da escola de samba e a verborragia desbocada funcionam, há outras que parecem saídas de programas já extintos da TV brasileira. A objetificação do corpo, embora masculino dessa vez, chega a ser anacrônica, por exemplo. Também falta a Santucci um pulso firme para conter os rompantes hiperbólicos de Hassum, que estica piadas até elas abandonarem o cinematográfico para abraçarem o teatral, com direito a todos os seus tiques e maneirismos.

Em contrapartida, é inegável que a liberdade maior oferecida pelo streaming beneficia Vizinhos, seja pela (hilária) presença de palavrões ou pela possibilidade de brincar com religiões, como a inofensiva sequência que simula uma mesa branca. À produção também não escapa a oportunidade de fazer referências a programas de outras emissoras, algo impensável no ambiente austero da empresa dos Marinho.


De um jeito ou de outro, é difícil ficar indiferente às tentativas bem-intencionadas de Vizinhos, uma comédia de veia popular, mas livre da insipiência que contaminou boa parte do nosso circuito comercial nas últimas décadas.


NOTA 6


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