"Besouro Azul" cativa com história descomplicada e calorosa
Depois de amargar bilheterias abaixo do esperado com Adão Negro, Shazam! Fúria dos Deuses e The Flash, a DC resolve apostar em Besouro Azul para estancar a sangria e reconquistar seus fãs. A aposta é arriscada, pois trata-se de um super-herói muito longe do nível de popularidade dos principais nomes da editora. O herói surgiu nos quadrinhos em 1939, mas só se tornou propriedade da DC Comics na década de 80, quando Jaime Reyes se tornou a terceira encarnação do super-herói. De ascendência mexicana, o jovem retorna a Palmera City, sua cidade natal, para morar com a família após terminar a faculdade. Sem dinheiro e com o pai enfrentando problemas de saúde, Jaime consegue um emprego na corporação Kord, presidida pela inescrupulosa Victoria Kord (Susan Sarandon, no piloto automático). É lá também que ele conhece Jenny Kord (Bruna Marquezine), sobrinha de Victoria e seu futuro interesse romântico.
Os problemas começam a aparecer quando a vilã, após 15 anos procurando, finalmente consegue encontrar um misterioso escaravelho, capaz de fornecer energia e servir como material bélico. Obviamente, como a maioria dos vilões contemporâneos, ela resolve usar o artefato para criar seu próprio exército e vender a quem pagar mais. Para impedir os planos malignos da tia, Jenny decide roubar o escaravelho da empresa, mas na fuga acaba deixando-o nas mãos de Jaime. O resto você já deve imaginar, pois o jovem acaba sendo escolhido pelo dispositivo e enfrenta uma série de dificuldades para dominar e aceitar seus poderes.
A trama escrita pelo mexicano Gareth Dunnet-Alcocer (Miss Bala) não tem a menor vergonha de utilizar uma infinidade de clichês super-heróicos, fazendo com que a produção soe tremendamente derivativa. São elementos que já foram aproveitados por obras como O Fantasma (1996), Homem-Aranha (2002) e Homem de Ferro (2008), só para citar algumas. O primeiro ato também exibe uma parcela considerável de diálogos expositivos, concebidos sob medida para explicarem, por exemplo, as motivações dos vilões, que por sua vez não passam de caricaturas unidimensionais.
Tudo isso, no entanto, revela a forma trôpega encontrada por Alcocer de fazer com que Besouro Azul represente um retorno a uma época na qual os filmes de super-heróis não contavam com a mesma sofisticação narrativa de hoje. Narravam histórias descomplicadas e muitas vezes previsíveis, mas que ofereciam experiências agradavelmente escapistas. Por outro lado, o que impede o filme de se estabelecer como mais um fracasso da DC, que segue patinando para se reencontrar nos cinemas, é a ligação simbiótica entre Jaime e seus parentes.
Essa conexão entre os Reyes fica palpável desde a primeira vez que a família se reúne, criando momentos que alternam entre o humor e a emoção, embora nem sempre com sutileza. Sim, o diretor porto-riquenho Angel Manuel Soto (da minissérie Menudo: Sempre Jovens) pesa a mão no melodrama ao trabalhar com os conflitos enfrentados pela família Reyes, mas acerta em cheio ao desenvolvê-los como personagens com quem o espectador pode facilmente se identificar. Assim, uma vez que esse elo é construído, fica muito difícil não simpatizar com os adoráveis parentes de Jaime, principalmente a vovó, interpretada com irreverência e energia pela sempre excelente Adriana Barraza, indicada ao Oscar por Babel.
Mas Besouro Azul também é eficaz na ação, elaborando sequências que, embora nada complexas, são estilosas e bem coreografadas, permitindo que o espectador esteja sempre ciente do que está acontecendo. E se The Flash sofreu com as críticas aos seus efeitos visuais, a nova produção da DC é bem resolvida nesse aspecto, optando por utilizar o mediano orçamento de 120 milhões de dólares para entregar um resultado acima da média. Ajuda também o fato de Jaime não ser um personagem atormentado, afinal, à medida que aceita seu destino como super-herói, ele não esconde a alegria por atirar com canhões de energia e fazer acrobacias enquanto massacra bandidos. Essa empolgação é contagiante e contribui para a atmosfera leve e descontraída que a produção constrói.
Falando em construção, Besouro Azul merece elogios pela forma com que apresenta Palmera City, uma metrópole moderna e com evidentes raízes latinas, algo que o design de produção é competente ao ressaltar através da arquitetura do local. Até mesmo a distância entre a casa dos Reyes e o centro da cidade serve para ecoar uma realidade infelizmente ainda enfrentada pelos latinos que vivem nos EUA, com as minorias residindo nas periferias e a elite povoando arranha-céus modernos no centro da cidade. Isso mostra que a produção não se esquivou do discurso político, reverberando temas como racismo e gentrificação, obstáculos cotidianos dos imigrantes latinos.
E é claro que eu não poderia deixar de comentar sobre Bruna Marquezine, atriz brasileira que está debutando em Hollywood. Comprovadamente talentosa desde criança, Marquezine deixa uma forte impressão, começando sua carreira internacional com o pé direito. E ao contrário do que já aconteceu com atores brasileiros em experiências internacionais, sua personagem não é limitada a poucos minutos de tela, pois Jenny Kord possui seu próprio arco dramático e se beneficia imensamente da química entre sua intérprete e Xolo Maridueña. Aliás, há uma cena específica que deverá levar os fãs brasileiros à loucura, com a estreante tendo seu próprio momento para brilhar. E intensamente.
Inteligente ao reconhecer a saturação dos filmes de super-heróis, Besouro Azul chega aos cinemas propondo um retorno aos primórdios desse subgênero, oferecendo uma experiência que não busca seduzir o público com sequências de ação espetaculares ou uma narrativa rebuscada, mas sim através do núcleo familiar de sua história. Em outras palavras, trata-se de um filme com alma.
NOTA 6,5
Obs: Há duas sequências pós-créditos
Confira também a crítica em vídeo:
Parabéns pela crítica e principalmente pelos elogios para a interpretação da Bruna Marquezine.