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Foto do escritorGuilherme Cândido

"A Mulher Rei" | Viola Davis brilha em épico de ação


Na longa história do Cinema, é comum algum gênero (ou subgênero) ficar em baixa, com filmes que amargam bilheterias fracas em função do baixo interesse do público. Já aconteceu com os musicais (mais de uma vez) e até hoje acomete os faroestes. Mas se há um segmento que parece nunca deixar de ser produzido, este é o épico. Não por acaso, 2022 já nos presenteou com uma parcela considerável de filmes épicos. Dois, em especial, chamam atenção por um detalhe curioso: enquanto a Universal Pictures promoveu O Homem do Norte como um filme de ação, sendo claramente uma obra de vertente dramática, a Sony/Columbia insiste que A Mulher Rei se trata de um épico histórico.


No entanto, por mais que traga o famigerado “baseado em fatos reais” em suas peças publicitárias, a produção usa e abusa da licença poética para contar a história do conflito entre Daomé (hoje Benim) e o Império Oió (de origem iorubá), que em 1823 chegou ao ápice graças ao incentivo de colonizadores europeus, interessados em negociatas envolvendo o tráfico de escravos. Quando os Oió se aliaram ao povo Mahi para invadir as terras e capturar cidadãos de Daomé, ao rei Guezô (John Boyega, o Finn de Star Wars) não restou alternativa para defender o povo senão recorrer ao seu próprio exército de elite, que marcou época por ser composto exclusivamente por mulheres.

Lideradas pela brava Nanisca (Viola Davis, de O Esquadrão Suicida), as chamadas Agojie eram moças que não se curvavam aos costumes patriarcais, como Nawi (a sul-africana Thuso Mbedu), entregue pelo próprio pai ao governo por recusar um casamento arranjado. Acolhida pelo exército, ela aprende técnicas avançadas de combate enquanto tenta se ajustar à nova família representada pelas demais guerreiras, mas acaba atraída pelo português Malik (Jordan Bolger, de O Livro de Boba Fett), que jura não concordar com os ideais escravocratas de seu país.

Ao contrário do supracitado O Homem do Norte, que prezava pela fidelidade histórica, tudo em A Mulher Rei é elaborado meticulosamente para servir à ação, o que explica a estrutura formulaica concebida para abarcar elementos consagrados desse tipo de filme. Assim, à roteirista Dana Stevens (Paternidade), pouco importa o contexto político ou o uso indiscriminado de convenções, pois o que vale mesmo é fornecer material para batalhas.

Portanto, é triste ver uma obra tão bem-intencionada tratar com tamanho maniqueísmo seus personagens, que oscilam entre a vilania absoluta e o heroísmo incondicional. Alguns diálogos (“meu coração tem muitas cicatrizes”, “os sussurros estavam certos”) só não doem mais do que aqueles proferidos pelos “portugueses”, carregados de um sotaque tão forte que transformam qualquer conversa mais íntima numa farsa constrangedora, já que são vividos por atores britânicos.

Num elenco luxuoso e que conta com a sempre excelente Lashana Lynch (a Nomi de 007 Sem Tempo Para Morrer) mais uma vez brilhando num papel debochado, mas com uma fisicalidade desafiadora, a jovem Thuso Mbedu não faz feio, exibindo carisma e impressionando nas sequências de ação, mas o inquestionável destaque fica mesmo é por conta de Viola Davis. A vencedora do Oscar, incapaz de oferecer uma performance no piloto automático, consegue a proeza de surgir fisicamente imponente numa cena e emocionalmente vulnerável em outra, mostrando um alcance dramático nada surpreendente. Uma das maiores atrizes em atividade, Davis se coloca novamente em condições de ser reconhecida numa temporada de premiações. Num mundo justo, verdade seja dita, seu nome seria recorrente no Oscar.

Mesmo derrapando esporadicamente no CGI (especialmente no fogo falso), o filme oferece um verdadeiro espetáculo visual se levarmos em conta o orçamento de 50 milhões de dólares, administrado para caprichar nas poucas, mas intensas sequências de ação. Aqui, cabe um elogio às coreografias de luta, potencializadas por uma direção que toma o devido cuidado para mantê-las sempre compreensíveis.


Vibrante e com um final talhado para recompensar o público, A Mulher Rei oferece pouco mais de duas horas de puro entretenimento e se seus instantes finais podem soar auspiciosos demais, ao menos propiciam um bem-vindo reconforto em tempos de turbulência social.


NOTA 6

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